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Abismo salarial: CEO ganha mais de mil vezes a média dos funcionários nas maiores empresas da bolsa
15 de Junho de 2023
José Cruz/Agência Brasil
Pela primeira vez as companhias listadas na bolsa brasileira estão sendo obrigadas a divulgar a diferença entre a maior remuneração individual paga a um de seus executivos e a média de todos os seus trabalhadores.
Em alguns casos, essa disparidade salarial chega a ultrapassar as 1000 vezes. Numa das empresas, passou de 4000 vezes.
A informação faz parte do novo formulário de referência entregue ao regulador pelas empresas com ações negociadas na B3, que acaba de entrar em vigor.
Entre as mudanças, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) passou a exigir alguns dados do universo ESG, como inventário das emissões de carbono e diversidade de gênero e raça dos colaboradores. Os dados entregues agora são referentes a 2022.
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No caso da disparidade salarial, ela é medida tomando-se a maior remuneração paga pela empresa, em geral a do CEO, e a mediana da remuneração de todos os demais funcionários. Cada empresa fez o seu próprio cálculo, seguindo as orientações gerais dadas pela CVM, e é possível que tenham sido aplicadas diferentes interpretações da fórmula de cálculo. Poucas companhias explicaram como chegaram ao indicador.
Seja como for, a transparência dada a essa informação a partir de agora deve ajudar a pautar a discussão em torno do abismo salarial nas empresas do país e de que forma isso contribui para perpetuar a desigualdade social que se vê fora delas
Levantamento feito pelo Reset com as 25 companhias com maior peso no índice Bovespa aponta que a maior disparidade é do frigorífico JBS, onde o CEO ganhou 1100 vezes a mediana dos funcionários.
A companhia justifica no documento entregue à CVM que “a maioria dos mais de 140 mil colaboradores da companhia alocados em suas unidades produtivas no Brasil ocupam cargos operacionais e, portanto, com uma remuneração mais próxima ao piso salarial da categoria, definida por meio de acordo e/ou convenção coletiva e alinhada às demais remunerações de empresas do setor” e que “a remuneração dos executivos leva em consideração desafios, desempenho e resultados atrelados a uma companhia de porte global.”
O segundo maior gap salarial é registrado pela locadora de veículos Localiza, com múltiplo de 651 vezes.
Ela é seguida pela mineradora Vale, de longe a empresa com maior participação no Ibovespa, com um múltiplo de 574 vezes.
À CVM, a mineradora diz que “esse multiplicador é influenciado pelos resultados da empresa, uma vez que 70% da remuneração do presidente é variável e está relacionada às metas de curto e longo prazo da companhia”.
Na sequência estão a empresa de saúde Rede D’or, com 384, a companhia de logística Rumo, com 370, e a fabricante de bebidas Ambev, com 359.
A própria B3 está entre as empresas com maior disparidade salarial entre a cúpula e a base, com múltiplo de 126 vezes, na 13ª posição.
Uma empresa do pelotão de elite do Ibovespa se recusou a prestar a informação: o banco BTG Pactual alegou confidencialidade dos dados.
Disparidade astronômica
Também integrante do Ibovespa, embora não incluída entre as 25 maiores, a varejista de calçados Arezzo se destaca pela disparidade astronômica: o CEO ganha 4874 vezes a mediana do salário dos demais funcionários.
Outro caso que chama atenção é o da rede de supermercados Carrefour, que tem um múltiplo de 1734 vezes.
Três outros frigoríficos que estão no Ibovespa também exibem grandes gaps salariais, indicando ser algo estrutural no setor. Minerva tem múltiplo de 477 vezes, Marfrig, 467, e BRF, 313.
Marfrig e BRF trouxeram explicações semelhantes à da JBS, dizendo que a maioria dos trabalhadores ocupa cargos operacionais, com remuneração próxima ao piso da categoria.
As empresas estatais se destacam no ranking pela pequena diferença existente entre a remuneração do CEO e a do corpo de funcionários, reforçando o fato de que os salários dos executivos dessas companhias costumam ficar abaixo dos de mercado, enquanto os funcionários usualmente têm mais benefícios do que na iniciativa privada.
O menor múltiplo da lista é da Eletrobras (4 vezes), que acabou de ser privatizada, enquanto BB Seguridade tem índice de 5 vezes, Petrobras, 5,7, e Banco do Brasil, 9,4.
A forma como a nova informação foi trazida no formulário de referência difere muito de companhia para companhia.
Algumas, como a BB Seguridade, se limitaram a informar o número. Outras se preocuparam em informar em mais detalhes como chegaram ao cálculo, detalhando quais componentes de remuneração foram considerados. Uma minoria incluiu explicações para a diferença encontrada.
Empresas de atuação internacional, como JBS, Ambev e Vale, alegaram que os números podem não refletir a realidade, já que não contemplam a remuneração paga aos funcionários nos demais países de atuação.
Fonte: Capital Reset, por Vanessa Adachi