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Troca de seguro-desemprego por FGTS deve ser restrita a maiores salários
27 de Junho de 2017 / Trabalhador
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, confirmou que o governo estuda a proposta de reter parte do FGTS dos trabalhadores demitidos sem justa causa para economizar com o pagamento do seguro-desemprego, conforme revelado ontem pelo GLOBO.
A proposta foi criticada pelas centrais sindicais e pelo senador José Serra (PSDB-SP), que classificou-a de “aberração”. Agora, nos bastidores, dizem fontes, discute-se restringir essa medida aos trabalhadores com maiores salários.
Segundo uma fonte a par das discussões, há muitas variáveis que serão avaliadas na hora de tomar a decisão, como por exemplo, o fato de o valor do seguro-desemprego (entre R$ 937 e R$ 1.643) ser considerado baixo para quem tem renda mais elevada. Foram identificados alguns casos de trabalhadores nessa situação que foram demitidos e não requisitaram o seguro-desemprego. Além disso, quase 70% das contas do FGTS têm saldos equivalentes a um salário — insuficiente para cobrir os três últimos salários do trabalhador.
CONSELHO CURADOR APENAS REGULAMENTARIA
A proposta do governo altera a sistemática de saque do FGTS e da multa de 40% nas demissões sem justa causa: em vez de serem retirados de uma só vez, os valores a que o trabalhador tem direito seriam parcelados em três meses para cobrir o seu último salário. Se no fim desse período ele não conseguisse outro emprego, entraria com o pedido do seguro; se conseguisse, teria direito a sacar o saldo restante do FGTS e a multa de 40% paga pela empresa.
— O uso do FGTS para o seguro-desemprego é algo que está em discussão. É um assunto embrionário e está em fase de discussão no Ministério do Planejamento e no Ministério da Fazenda — disse Meirelles em evento na Câmara Americana de Comércio (Amcham Brasil), em São Paulo.
Segundo ele, o tema está sendo discutido entre os técnicos das duas pastas e ainda não foi levado aos ministros:
— É um tema que está passando por uma avaliação técnica. Quando subir (para o nível dos ministros), vamos analisar se é algo positivo ou negativo, mas essa proposta ainda não chegou a nós com números, com algo objetivo.
Segundo fontes envolvidas nas discussões, a equipe econômica tem urgência em adotar a medida, apesar de o assunto ser polêmico. Mas isso vai depender da conclusão de cálculos sobre a economia para os cofres públicos. Se os estudos demonstrarem, por exemplo, que o governo está, na prática, adiando o pagamento do seguro porque o trabalhador está levando muito tempo para conseguir emprego, a ideia pode ser engavetada.
Pelos dados do Dieese, o tempo médio para conseguir uma nova colocação no mercado é de 42 semanas (10,5 meses) nas regiões pesquisadas (Porto Alegre, Distrito Federal, São Paulo e Salvador). Em abril do ano passado, era de 34 semanas. Segundo a coordenadora da pesquisa, Lúcia dos Santos Garcia, o tempo aumentou porque a taxa de desemprego está subindo. O índice está hoje em 13,6%.
Para adotar a medida, o governo terá de mexer em duas leis: a que criou o FGTS e define as regras de saque, e a que instituiu o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Embora deficitário, é o FAT que banca o seguro-desemprego.
Não há necessidade de aprovação do Conselho Curador do FGTS, onde o governo tem maioria e voto de Minerva. O papel dos conselheiros seria o de regulamentar o novo modelo de saque depois da aprovação da medida provisória no Congresso.
Caso vingue, a medida não prejudica as contas do FGTS. Ao contrário, a retenção dos saques até ajuda. Mas ela prejudica o trabalhador, que nas demissões sem justa causa pode sacar todo o saldo e a multa de uma só vez, e ainda tem direito ao seguro-desemprego, que varia entre três e cinco parcelas, podendo chegar a sete em casos excepcionais.
Em um post publicado no Facebook, Serra afirmou que os trabalhadores demitidos “perderiam por dois lados: impossibilidade de sacar o FGTS de uma vez e cancelamento de três meses no recebimento do seguro desemprego. Acredite, se quiser.” O senador disse ainda que a proposta é de “uma insensibilidade social infinita”. Serra, cujo partido, o PSDB, faz parte da base aliada do governo, garantiu que “a aberração cogitada jamais seria aprovada pelo Congresso. E se viesse como medida provisória, seria prontamente devolvida.”
Já as centrais sindicais classificaram a proposta de “confisco” e “perversidade” com os trabalhadores. A Força Sindical disse que, se a ideia avançar, entrará com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir a implementação da medida. Para o presidente da Força, Paulo Pereira da Silva, “a ideia demonstra uma total e clara falta de sensibilidade social por parte dos tecnocratas do ministério.”
Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), ressaltou que o trabalhador já perde com a baixa remuneração do FGTS:
— O governo toma essas decisões sem consultar os representantes dos trabalhadores que estão no Conselho Curador do FGTS. Esse é um dinheiro do trabalhador.
Para a Central Única dos Trabalhadores (CUT), o governo deveria “pensar em medidas de geração de emprego e não confiscar o FGTS.”
Diferentemente de um fundo de aplicação, em que os saques reduzem diretamente o patrimônio, o FGTS tem um papel de acumular reservas para compensar o trabalhador na hora da demissão. Por isso, as contas individuais são apartadas do restante de negócios do Fundo.
Dessa forma, o dinheiro do trabalhador está sempre garantido. Segundo o balancete de novembro de 2016 (o mais recente), o FGTS tem em caixa R$ 5,888 bilhões. Outros R$ 181,3 bilhões estão aplicados no mercado financeiro, e R$ 277,7 bilhões estão emprestados (habitação, saneamento, mobilidade urbana, infraestrutura).
Já as contas dos trabalhadores têm um saldo total de R$ 370,3 bilhões. Ao todo, são mais de 140 milhões de contas, entre ativas e inativas.
Fonte: O Globo, por Geralda Doca e Ana Paula Ribeiro