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Juiz condena empresa que realizou manobra para justificar dispensa de empregada grávida

26 de Agosto de 2015 / Direitos Trabalhistas

O dia da mulher é festejado em março. E foi justamente nesse mês que o juiz Marcelo Paes Menezes, titular da Vara do Trabalho de Muriaé, se deparou com um caso envolvendo nítido desrespeito a uma empregada gestante. Por esta razão, ele lamentou que não há muito o que comemorar.

O que aconteceu foi o seguinte: O supermercado reclamado despediu a empregada, sem justa causa, quando ela estava grávida. Posteriormente, promoveu a readmissão, para alguns dias depois realizar nova despedida, agora ao fundamento de abandono de emprego. Para o julgador, ficou clara a manobra para tentar sustentar a validade da dispensa. Uma conduta que qualificou de “contorcionismo jurídico e incompreensível” e de “muita criatividade”. A forma como foi tratada a trabalhadora foi considerada um total desprezo às regras de proteção ao trabalho, especialmente quanto à mulher.

O magistrado observou na sentença que a empresa não negou que a empregada estivesse grávida quando foi despedida, apenas afirmou que não sabia da gravidez. “Ora, isso é absolutamente irrelevante. O conhecimento da gravidez, fato subjetivo, não é importante, porquanto o que interessa é a existência da gravidez, fato objetivo”, destacou, lembrando que a estabilidade gestante dispensa até mesmo o conhecimento da gravidez pela própria empregada. “Basta a existência da gravidez, independentemente do conhecimento”, enfatizou.

A versão da ré, de que a empregada teria sido reintegrada quando a empresa soube da gravidez, foi contrariada pela prova. A análise dos documentos revelou que, na verdade, houve uma recontratação na data de 08/12/14 (a dispensa foi em agosto). “Fica claro, muito claro, que se houve arrependimento da ré, a conduta para reparar o erro anterior se traduz em um novo erro, visto que, como demonstrado antes, a ré não tomou as providências necessárias para tornar ineficaz a despedida”, concluiu.

Causou espécie ao magistrado o desassombro da ré no que diz respeito à não observância do regramento de proteção ao trabalho. Para ele, somente uma crença muito grande na impunidade pode justificar a conduta. A dispensa da empregada grávida, com readmissão posterior e depois dispensa por justa causa, sob fundamento de abandono de emprego, foi considerada até mesmo inusitada. “É muita criatividade!!”, destacou.

A decisão enfatizou que não houve reintegração no caso, mas sim nova contratação da reclamante, sem que o réu tenha esclarecido qual seria o enquadramento jurídico pertinente ao período que vai da despedida ilegal à nova contratação. Segundo o magistrado, o caminho natural seria determinar a reintegração da empregada. Porém, em função da clara animosidade resultante do litígio, ele entendeu que a medida apenas pioraria a situação, contrariando a intenção do legislador, que é garantir a tranquilidade emocional e material da gestante durante a gravidez.

“A ré parece desconhecer que a preservação do bem estar da grávida diz respeito à perpetuação da espécie humana. O interesse em jogo, em casos tais, perpassa o interesse da mulher e se espraia a toda coletividade. O bem maior que se pretende preservar é a vida que está sendo gerada, que no conforto do útero espera, pacientemente, o dia de vir à luz. Há vida no útero, no útero a vida se faz viva, merecedora da tutela jurídica. Se não houvesse nenhuma lei no mundo para garantir a gestante contra a discriminação da despedida, ainda assim o juiz deveria buscar inspiração para fazer justiça à vida que está sendo gerada”, ponderou na sentença. E pontuou que o juiz deveria buscar, então, inspiração nas palavras que o grande Guimarães Rosa colocou na boca do jagunço Riobaldo: “o correr da vida embrulha tudo. A vida é assim, esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”.

Com esses fundamentos, o supermercado foi condenado a pagar à reclamante indenização pelo período da estabilidade gestante, bem como indenização por dano moral no valor de R$10 mil. O julgador não teve dúvidas de que a despedida promovida configura ato ilícito, porque viola o direito à estabilidade gestante, assegurada na Constituição de 1988. Além disso, diz respeito à discriminação da autora, cuja gravidez não foi considerada pelo patrão.

O magistrado frisou que a prática ilícita não pode ser tolerada, sendo presumível a tristeza da empregada que se vê diante de um cenário tal, perdendo o emprego e, na mesma esteira, despojada do direito de manter a subsistência própria e da vida que está sendo gerada.

“Todos são iguais perante a lei. Assim apregoa a Declaração Universal dos Direitos do Homem. A Carta da República, na esteira do diploma citado, reconhece a igualdade de todos. Assim, a despedida discriminatória, a um só tempo, afronta a Declaração Universal dos Direitos do Homem e Carta da República. E se a despedida discriminatória toma em conta a gravidez, redobrada censura merece. O mundo contemporâneo grita por uma vivência livre de discriminações, valendo notar que muitos tombaram na defesa da igualdade, tal como o inesquecível Martin Luther King: “Eu tenho um sonho…”

Ao caso, foram aplicados os termos do artigo 5º, V, da CF/88 c/c artigos 927 e 932, III, do Código Civil, levando em consideração o juiz na fixação do valor as circunstâncias do caso concreto, o princípio da razoabilidade, a sorte econômica dos envolvidos e a gravidade da agressão. Ele explicou que a indenização por dano moral deve conter uma dupla face: à vítima, um lenitivo, uma compensação; ao causador do dano, uma punição, reveladora de um aspecto pedagógico.

A empregadora interpôs recurso, que está em tramitação no TRT-MG.

( 0000290-74-2015-5-03-0068-ROPS )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais

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